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quarta-feira, março 9

Mário por Mário

Nasci em Alegrete, em 30 de julho de 1906. Creio que foi a principal coisa que me aconteceu. E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. Bem! Eu sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente. Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão. Ah! mas o que querem são detalhes, cruezas, fofocas... Aí vai! Estou com 78 anos, mas sem idade. Idades só há duas: ou se está vivo ou morto. Neste último caso é idade demais, pois foi-nos prometida a Eternidade.
Nasci no rigor do inverno, temperatura: 1grau; e ainda por cima prematuramente, o que me deixava meio complexado, pois achava que não estava pronto. Até que um dia descobri que alguém tão completo como Winston Churchill nascera prematuro - o mesmo tendo acontecido a sir Isaac Newton! Excusez du peu... Prefiro citar a opinião dos outros sobre mim. Dizem que sou modesto. Pelo contrário, sou tão orgulhoso que acho que nunca escrevi algo à minha altura. Porque poesia é insatisfação, um anseio de auto-superação. Um poeta satisfeito não satisfaz. Dizem que sou tímido. Nada disso! sou é caladão, introspectivo. Não sei porque sujeitam os introvertidos a tratamentos. Só por não poderem ser chatos como os outros?

Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese. Outro elemento da poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das palavras. Talvez concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de farmácia durante cinco anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de Andrade, de Alberto de Oliveira, de Erico Verissimo - que bem sabem (ou souberam) o que é a luta amorosa com as palavras.

(Texto escrito pelo poeta para a revista IstoÉ de 14/11/1984)


Mário por outros...

- ""Um poema sem outra angústia que a sua misteriosa condição de poema" - foi assim que ele definiu sua poesia e, em parte, se definiu. Culltivava, sem dúvida, uma nostalgia existencial que os críticos julgaram expressão de passadismo. A sutileza de seu humor chegava às vezes à total irreverência, a visão lírica da aventura humana, o menino atrás da vidraça, o homem que mora dentro dele mesmo: o poeta.(...) Foram os jovens que descobriram Quintana, já ancião mas ainda poeta". Carlos Heitor Cony

- "Sem dúvida, foi o maior poeta do Rio Grande deste século". José Paulo Paes

- "É um poeta de excepcional delicadeza. A sua poesia se destaca por ser simples, suave e profunda". Antônio Callado

- "Uma poesia ( a de Quintana) difícil, porque intensamente alusiva, e de um humor sutir, irredutível.Uma clareza ilusória, porque de um instrumento multívoco. Aí está o segredo dos grandes poetas..."
Fausto Cunha
-  "MarioQuintana é o mais simples dos poetas brasileiros do século XX, e um dos mais difíceis. Dá a impressão de dizer as coisas mais comuns, as coisas que todo o mundo imagina que é capaz de dizer. Só que Quintana as diz como ninguém é capaz de dizê-las.Usa uma música verbal e um ritmo tão fino que não se percebe.A sua poesia é endovenosa.Quando o indivíduo nota, a poesia já entrou nele, penetrando-lhe o coração e a mente. É poeta tão simples que sua genialidade só é descoberta - como a luz das estrelas -muitos anos depois de ter brilhado!" Armindo Trevisan

- "Ele consegue o milagre de prolongar a infância.(...) Uma nostalgia, uma faz-de-conta, um reino mágico". Hélio Pólvora

- “...Alguns dos teus poemas e muitos dos teus versos não precisam estar impressos em tinta e papel: eu os carrego de cores, às vezes, brotam espontaneamente de mim como se fossem meus. De certo modo, são meus, e hás de convir que a glória maior do poeta é conceder essas parcerias anônimas pelo mundo...". Paulo Mendes Campos (em carta á Mario Quintana)

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